sábado, 30 de julho de 2011

Hoje dou-vos a conhecer... o Óscar

O Óscar tem sido a minha companhia nestes meses que estive sozinho. 
É ele quem faz com que eu não jante sempre sozinho nem almoce todos os dias sem ninguém. Ele põe-se ali, encostado a uma parede e fica a olhar para mim com aqueles olhos grandes e negros e em troca eu olho para ele com os meus olhos e ficamos assim por largos minutos, por vezes até ele me sorrir.
Vejo-o muitas vezes principalmente durante noite ou de manhã cedo, às 7h estou eu a sair do banho e ele lá está, encostado à parede com o seu olhar atento ou à noite quando me vou deitar lá está ele, interessado...

O Óscar é uma osga e de tão pequeno e frágil é quase transparente. Apesar de o meu colega Miguel achar que as osgas são peçonhentas e que se uma nos tocar ficamos com a pele marcada para todo o sempre nós os dois temos vivido pacificamente, eu não o chateio e ele não me incomoda e penso que nem sequer lhe passaria pela cabeça passear-se em cima de mim enquanto durmo. É bem capaz que ele coma os restos de comida que deixo na cozinha mas eu não me importo porque não estava a pensar comê-los e a casa é suficientemente grande para nós os dois vivermos nela e passarmos dias sem nos encontrarmos. Mas hoje o Óscar passou das marcas, andava eu todo descascado pelo quarto depois do banho matinal quando apanho aqueles olhos a espiar-me... ele estava ali, escondido a ver-me na minha nudez. Eu nem sou muito esquisito com essas coisas nem nada e até tenho um gene exibicionista (a minha Tina que o diga, eu ando sempre a tentar convencê-la a fazer nudismo) o problema mesmo foi o facto de estar a espiar-me escondido, todo camuflado, só se viam aqueles dois olhões negros a ver-me com muita atenção, não estava na parede como antes onde eu o via facilmente, parecia tímido e preverso. Ainda por cima logo à noite o pessoal vem jantar aqui a casa e se ele se põe escondido a espiar vai incomodar os convidados pela certa. As pessoas vão sentir-se observadas sem saber bem porquê. Não quero que ele se habitue a espiar os outros.

Pu-lo fora de casa, expulsei-o. Ele ficou ali, na pedra da varanda todo rijo com o rabo empinado como quem diz ‘És mau mas eu sou pior. Tem cuidadinho, tu és grande mas eu sou peçonhento.’ Não lhe liguei nada e foi apenas uma lição. Hoje a porta fica aberta o dia todo e ele se quiser voltar pode voltar.

Só há uma questão que me intriga e desafia tudo o que conheço do mundo... tenho quase a certeza que há duas semanas atrás o Óscar já tinha pelo menos o dobro do tamanho.
Será que as osgas vão ficando mais pequenas com o tempo, ao contrário de todos os outros seres vivos deste mundo?

Eu volto,
Bernardo Marques






sábado, 2 de julho de 2011

A Tuga em Desgraça



Com as noticias que vou vendo e as desgraças que são anunciadas aí desse lado do equador dei por mim a pensar:
Suponhamos que um tuga ganha, com o seu esforço do dia a dia, mil euritos por mês (já não são todos). No dia em que recebe o dinheirinho das mãos do patrão chega o estado ao pé dele e diz :

estado: - 'eh psst, passa para cá a minha parte.'
tuga:     - 'a tua parte? mas quanto é que é isso?'
estado: - 'eh pá, é coisa pouca, são 11% de segurança social, que é para teres hospitais, escolas e tudo isso que te dá um jeitão e mais 12% de imposto sobre os rendimentos que é para eu poder fazer estradas, jardins, e tudo o que gostas.'
tuga:    - 'ah... bem visto, nem me lembrava disso, mas realmente eu até preciso dessas cenas todas para viver e trabalhar... vai, toma lá 230€.'

Esta pequena conversa acontece já depois do mesmo estado ter ido ao patrão pedir o correspondente a 23,75% (237€) do que ia pagar ao tuga, o que por sua vez terá saído do mesmo esforço do dia a dia (do pobre tuga, não é do estado nem do patrão). 
No final de contas o tuga leva 770€ para casa e o estado leva 467€.

O pobre homem com os seus 770€ não consegue juntar nada e durante o mês gasta tudo o que ganha. 
Em tudo o que ele compra pelo menos 23% vai direitinho para as mãos do estado (IVA) ou seja daqueles 770€ que o tuga levou para casa 177€ vão cair no bolso do estado.
Fazendo bem as contas o tuga, com o suor do seu trabalho consegue comprar bens no valor de 593€ e o estado, do mesmo suor, ganhou 644€ sem ter suado nada.

Ora bem, supondo que o IVA reduzido dos 'bens essenciais' é compensado por muitos outros impostos (bastante elevados por sinal) que ignorei nestas contas (imposto automóvel, petrolífero, SCUTS, etc...) podemos dizer que, genericamente, do suor do trabalho de um gajo o estado fica com 52% e o trabalhador com 48%.

Sou só eu que acho que isto roça o proxenetismo ou o zé povinho é todo muito tonto e deixa-se enganar facilmente?

Suponhamos que a tuga é um país de dois gajos. O Pedro e o Zé. O Pedro trabalha e o Zé governa. Os últimos 30 anos da tuga podem ser contados da seguinte forma:

A cada final de mês:
Pedro: - 'Oh Zé, chega aqui. Olha, já arrucebi o ordenado, toma, 600€ pa ti, pa me governares, 600€ pa mim. Eh lá, mas sobram estas notas? Raios... nunca acerto muito com as contas, fica com elas pa me governares um bocado melhor.

O Zé vai à sua vidinha de governar o Pedro (que consiste em grande parte em não fazer nada e uma outra parte em meter algumas das notas que o Pedro lhe deu no bolso) e vai fazendo o que bem entende com o dinheiro.
O Zé, como governo que é, ainda consegue uns empréstimos para governar melhor enquanto o pobre Pedro tem que fazer a sua vida com o que ganha porque ninguém lhe dá crédito.

Passados alguns anos:

Zé:        - 'Eh Pedro, tamos metidos numa enrascada que nem te conto... desta é que tamos feitos.'
Pedro:  - 'Atão? Mas o que aconteceu? Vá lá, também não pode ser assim tão mau.'
Zé:      - 'Ah não? Olha pá, pedi uns empréstimos para umas cenas e para outras, pa te governar melhor sabes? E agora já devemos 100% do PIB e ainda por cima com os gastos que temos, todos os anos gasto 9% do PIB a mais do que o guito que me dás.'
Pedro:   - 'Estamos feitos? Então tu pedes emprestado agora desenmerda-te. '
Zé:        - 'Desenmerda-te não. Eu sou o teu governo. Tens é que me dar mais algum. Eu consegui aí que uns marmelos (FMI) me emprestassem mais uns 70% do nosso PIB para eu poder pôr as contas em dia. Agora tenho que ganhar mais para pagar a prestação, ou então cortar nas despesas.' 
Pedro:   - 'Então e porque não cortas nas despesas? E que raio é isso do PIB que não percebo nada, nem sei de que valores estamos a falar.'
Zé:       - 'Eh pá, o PIB é uma cena complicada que se calcula com umas contas maradas, mas podemos dizer que é tudo o que tu ganhas mais o que eu ganho durante um ano inteiro e cortar nas despesas está fora de questão, eu faço as leis e a partir de agora tens que me dar mais, vou aumentar aí uns impostos que ainda vamos ver e... olha, lembras-te do subsídio de Natal? Já me dás a minha parte desse, mas se calhar, como é um extra e é, dás-me ainda mais metade da parte que fica para ti.'
Pedro:   - 'Espera lá? Então tu já deves tudo o que nós os dois juntos ganhamos num ano inteiro? Todos os  anos tu gastas tudo o que eu te dou e mais 9% do que nós os dois juntos ganhamos num ano inteiro? Ainda te vão emprestar mais outro tanto para endireitares as contas e eu é que tenho que pagar isso tudo?'
Zé:        - 'Hm... essa é uma forma um pouco redutora de ver a coisa, afinal de contas eu é que nos vou safar desta encrenca... mas sim, é mais ou menos isso.'
Pedro:   - 'Ah, tá bem.'
Zé:        - 'Tá arresolvido.'

Faz sentido?
Será que não precisamos mudar de vida em vez de mudar de governo?

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